Qual a magia do faz de conta?
Todos nós algum dia vivemos experiências muito significativas em
nossas vidas, como fazer castelos,tendas, esconderijos ultra-secretos,barracas
usando lençóis... Quando arranjávamos tais espaços era como se realmente
acreditássemos no que criávamos. Tornar viável o que desejamos é um exercício
muito interessante.
Transformar impossibilidade em possibilidade é um
aprendizado para a vida. Com criança a regra do improviso é lei! Empreendedora
por natureza, sempre persegue seus objetivos na brincadeira e encara esta
atividade com toda a seriedade, estando muito presente no que faz. A criança
está tão empenhada em brincar porque uma das coisas importantes nesta atividade
é a vontade de entender como ocorrem as relações sociais, como é o mundo dos
adultos. Brincando de compra e venda, de casinha, de médico, de mecânico, a
criança também se apropria do mundo adulto.
A contradição entre a necessidade de
agir da criança, em relação aos objetos e ao mundo adulto, e a impossibilidade
de executar operações exigidas pelas ações pode ser resolvida na brincadeira.Se
ela ainda é pequena para escolher uma profissão, pode se imaginar em uma que
elegeu na brincadeira. Se ainda é nova para dirigir um automóvel, pode iniciar-se
no papel de motorista, com carrinhos de brinquedo, ou mesmo separando uma
simples roda e imaginando-se num jogo de dirigir um carro. Assim, dizendo: “tá
bom que eu era motorista...” Constrói e conhece suas possibilidades de atuação
na sociedade. Outro motivo pelo qual a criança brinca é para experimentar
sensações, vivenciar outras formas de se colocar no mundo. Talvez fique mais
claro com um exemplo. Uma criança que brinca ser jogador de futebol – o que é
diferente de jogar futebol (jogo de regra) – imagina- se grande craque em seu faz-de-conta.
À medida que vai fazendo passes fantásticos com incríveis dribles narra estas
maravilhas, como se fosse ao mesmo tempo jogador, juiz, radialista e até
torcida. Sim, pois quando faz o gol, neste jogo de faz-de-conta de jogador de
futebol, incorpora o Maracanã inteiro no coro da torcida clamando pelo grande
jogador que se é na brincadeira. Experimentar o sucesso na brincadeira, a força
ou a determinação de um herói, a braveza ou a doçura da mãe, a coragem do
pirata, o espírito de aventura de um viajante das galáxias, o ódio mortal às
criaturas do mal, tudo isso faz parte da vida. Viver intensamente todos esses
sentimentos no faz de- conta é também experimentar muitos papéis e aprender,
crescer e amadurecer com eles.
O brincar caracteriza-se como uma mescla entre as
apropriações culturais e a possibilidade de expressão da criança, fruto de sua
forma particular de pensar e de interagir com o mundo. Ela articula suas
próprias experiências de vida com as experiências de suas brincadeiras. Uma das
formas de apropriar-se da cultura ocorre pelo contato com as imagens e pelas
representações sociais. Nesse sentido, pode-se dizer que o brinquedo tem um lugar
de destaque na apropriação cultural por ser um importante fornecedor de
representações e imagens manipuláveis. Gilles Brougère, pesquisador do jogo,
nos ajuda a entender o brinquedo como uma “mídia” que carrega consigo conteúdos
simbólicos, representações e valores culturais produzidos pela humanidade. A
brincadeira, ao contrário do que pode parecer, não é espontânea, ela é sempre
referendada pela cultura.
Assim sendo, a brincadeira de médico que ocorre em nossa
cultura é distinta da correspondente em uma cultura indígena. Da mesma forma, o
fato de o jogo de bonecas estarem presente principalmente entre as meninas não
é manifestação do instinto materno, mas sim reprodução das relações sociais
existentes na cultura, em que há uma divisão social do trabalho no cuidado com
as crianças.
Artigo: revista criança 29
Postado Por: Luciana Santos
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